Depressão na terceira idade pode estar associada à catarata
No Brasil, 11,5 milhões de pessoas sofrem com a depressão; entre os pacientes há alta incidência de brasileiros com mais de 60 anos.
O Brasil lidera os casos de depressão na América Latina. A doença acomete 5,8% da população, ou seja, 11,5 milhões de brasileiros – de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). No âmbito global, o número de casos cresceu mais de 18% nos últimos 10 anos; o avanço rápido impulsiona a previsão de que, em 2020, essa será a enfermidade mais incapacitante do mundo.
A Pesquisa Nacional de Saúde, conduzida em 2013, apontou que no país, as pessoas com idade entre 60 e 64 anos – início da velhice – são as mais acometidas pelo mal psiquiátrico. A psicóloga Eliane Pereira Mello, especialista em Psicologia Hospitalar em Reabilitação pelo Hospital das Clínicas de São Paulo (HCFMUSP), analisou as possíveis causas da incidência da doença na maturidade e apontou a catarata como um dos fatores que pode debilitar a saúde emocional do idoso, podendo causar depressão.
De acordo com a psicóloga, somos seres influenciados, ou seja, recebemos estímulos do meio e reagimos; por isso, a perda da visão tem impacto na incidência da depressão, assim como a perda de outros sentidos. “Existe uma fala comum aos pacientes idosos sobre a constante perda na vida trazida pela idade, seja na convivência com os demais, relacionamentos ou atividades diárias”.
Segundo a especialista, a alteração na visão gerada pela catarata influencia na dinâmica emocional do idoso, que passa a não ver as coisas como antes. “A visão opaca, ocasionada pela doença, com decorrer do tempo debilita a saúde emocional do indivíduo. Ele passa a ver a vida sem brilho e as relações sofrem alterações. Essa baixa qualidade da visão afeta a questão psicológica e a motivação para fazer as coisas que gosta como, por exemplo, assistir tevê. Em muitos casos, o idoso se queixa que o aparelho está com problemas, sem admitir que é a visão. Com isso, o indivíduo se isola, não tem a vivacidade para passear e ver os lugares bonitos”, afirma.
A especialista em neuropsicologia afirma que, normalmente, a família não associa as mudanças de comportamento ocasionadas pelas limitações de saúde trazidas pelo envelhecimento. Dessa forma, generaliza a forma de agir do idoso sem saber quais são os reais motivos para ele se comportar de determinada maneira. O cuidador familiar do idoso também não entende que o isolamento pode ter inúmeras causas – e que, uma delas, pode estar relacionada à perda ou diminuição da visão.
“O diagnóstico da catarata acarreta medo entre os pacientes idosos; eles ficam receosos em fazer a operação; e têm receio de ficarem cegos. Após o procedimento cirúrgico e melhora na visão, percebem que não correm risco de cair na rua; que podem sair e retomar as atividades que antes estavam esquecidas. Já aconteceu de um paciente relatar que, ao voltar a enxergar, passou a ir toda hora na padaria para tomar café com os amigos, conversar com os vizinhos e ter qualidade de vida”, relata Eliane, acrescentando que a família tem um papel fundamental na busca por um diagnóstico correto. “A grande questão do idoso é a dependência. São os filhos que levam o paciente ao médico ou avaliação psicológica. Mas, o idoso nega a velhice; nega que tem problemas de visão, porque não quer gerar incômodo para o filho ou ser acompanhado. Deseja realizar as atividades sozinho e nega as dificuldades para tal”, afirma.
Com medo de perder a autonomia e independência, o idoso vai protelando a busca por atendimento médico e se isola – tudo para evitar falar sobre o assunto com os filhos e não ter que assumir as dificuldades. “Na terapia, vamos trabalhando as questões do envelhecimento. Explico que em vários momentos podemos depender de alguém, mas a autonomia é algo nosso. É preciso empoderar o idoso para que possa fazer as próprias escolhas; para que tenha autonomia por um tempo maior. Para isso, existem ferramentas auxiliares como bengala, aparelho auditivo ou óculos, que muitas vezes, despertam um incômodo na utilização em sua rotina, mas que ajudam o idoso a interagir com o meio, sair do isolamento, ter qualidade de vida e se manter atuante e ativo no meio de convivência com os amigos e familiares”, finaliza.
Sobre a catarata e o negócio de impacto social
Maior sensibilidade à luz, visão embaçada, sensação de neblina nos olhos, ajuste constante no grau dos óculos e percepção que as cores estão desbotadas – esses são apenas alguns dos sintomas percebidos por pacientes com catarata.
O brasileiro com mais de 50 anos que depende da rede pública de saúde aguarda, em média, 314 dias por uma avaliação de catarata. Na prática, quase um ano inteiro para verificar se há indicação para cirurgia, segundo dados da Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo.
A catarata é responsável por 51% dos casos de cegueira no mundo;sendo a população idosa apresenta maior incidência da catarata senil –um processo natural de envelhecimento do cristalino e que pode ser reversível com a cirurgia. Estimativas apontam que 5% da população acima de 60 de anos deverá ter catarata no decorrer de um ano.
Considerando que o Brasil já possui 30 milhões de idosos, isso representa uma demanda potencial de 1,5 milhão de cirurgias de catarata por ano. Entretanto, o volume de cirurgias realizadas é inferior à demanda. Para endereçar esse desafio, Guilherme de Almeida Prado criou a Central da Catarata – negócio de impacto social que realiza cirurgias a preços mais baixos, aproveitando horários ociosos de hospitais oftalmológicos de referência. Essa ideia simples tornou a iniciativa uma solução de acesso para a população de menor renda.