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Política

Especialistas divergem sobre projeto que proíbe passaporte vacinal em Vitória

Na visão do advogado Flavio Fabiano, por exemplo, projeto aprovado pelos vereadores da Capital é inconstitucional, pois coloca regras do município acima do que foi determinado pelo Estado. Já Sandro Câmara não vê inconstitucionalidade na matéria

Marcelo Pereira , Rodrigo Araújo

Redação Folha Vitória
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Foto: Folha Vitória
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Passaporte vacinal pode deixar de ser obrigatório em Vitória se projeto de Lei for sancionado pelo prefeito Lorenzo Pazolini

O projeto aprovado pela Câmara Municipal de Vitória, nesta segunda-feira (14), que proíbe a exigência do comprovante de vacinação para se ter acesso a estabelecimentos públicos e privados na Capital, tem dividido a opinião de especialistas.

De autoria do vereador Gilvan da Federal (Patriota), o projeto de Lei segue agora para veto ou sanção do prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos). Além de proibir a exigência de passaporte vacinal em estabelecimentos comerciais, ele prevê multa a quem exigir o comprovante de vacinação em seu estabelecimento.

Para o advogado constitucionalista Flavio Fabiano, a matéria é inconstitucional e deverá ser contestada futuramente, caso vire lei. Segundo o especialista, ela vai de encontro ao que determinou o governo do Estado, em portaria da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) na última semana de janeiro.

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Na análise de Flavio Fabiano, o projeto já nasce com várias imperfeições jurídicas. "A primeira questão é quanto à competência para tratar esse tema, que é do Poder Executivo e não do Legislativo, uma vez que trata de questões relacionadas à própria organização e funcionamento do município. E isso cumpre ao chefe do Executivo, no caso o prefeito", explica.

Ele cita que o Supremo Tribunal Federal (STF) fez uma interpretação dos artigos 23 e 25 da Constituição Brasileira, em que esclarece o papel dos Estados, dos municípios e da própria União quanto ao funcionamento e a imposição de restrição em bens e serviços e que devem observar o interesse local. 

Foto: Foto: Reprodução/ Arquivo Pessoal
Advogado constitucionalista Flavio Fabiano diz que o projeto de Lei da Câmara de Vitória será contestado juridicamente por sobrepor a uma Lei estadual

"Ou seja, os municípios podem impor maior restrição relacionadas aos estabelecimentos comerciais e prestadores de serviços. Mas, na mesma interpretação, o STF também alertou que, em caso de flexibilização de normas pelo Estado, os municípios podem restringir, mas nunca o contrário. Ou seja, quando o Estado restringe não poderá o município flexibilizar regras", comparou. 

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Assim, na prática, a projeto de Lei aprovado pela Câmara de Vereadores de Vitória estaria acima do que recomenda a lei estadual, o que não é permitido. 

"Não tem o Legislativo competência para tratar matéria que é exclusiva do Executivo. E muito menos flexibilizar no âmbito local uma regra que está restritiva para o Estado", apontou, dizendo que não há diferenciação se o Estado determina por meio de Lei ou por portaria, como foi o caso da obrigatoriedade do passaporte vacinal recomendada pela Secretaria de Estado da Saúde (Sesa).

Já o advogado Sandro Câmara, especialista em Direito Público e Administrativo, tem uma visão diferente sobre o assunto. Para ele, o projeto de Lei aprovado na Câmara Municipal de Vitória não é inconstitucional.

Ele citou um posicionamento do STF em relação à MP 926, de 2020, editada pelo Governo Federal e que trata de diversas medidas relacionadas ao combate à covid-19, como dispensa de licitação em compras relacionadas à pandemia e regras para circulação de pessoas e mercadorias.

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"O Supremo Tribunal Federal pronunciou contrariamente à MP 926, reafirmando que as medidas de saúde pública visando ao combate à pandemia são competência comum a todos os entes federativos, cabendo à União o trabalho de coordenação, não como imposição, mas em respeito à autonomia dos entes e ao princípio federativo", salientou.

"No caso específico, considerando o que dispôs o STF na ocasião, não me parece que o projeto de Lei 174/2021 padeça de inconstitucionalidades, quer pelo aspecto material ou formal, pois o município poderia não só aplicar mais restrições em relação às normas estaduais e federais, como também, em sentido contrário, estabelecer medidas menos restritivas a par das já existentes, como o fez no caso da proibição do passaporte vacinal", acrescentou.

O advogado e professor Eduardo Sarlo destaca que, pela Constituição, é permitido aos municípios editar leis sobre saúde e vigilância sanitária, de interesse local e específico, suplementando outras de nível federal e estadual. O especialista explica que geralmente prevalece a norma de maior abrangência, em face dos interesses maiores da nação e do efeito integrador dela. 

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"Na preponderância entre o interesse econômico e o interesse à saúde em geral, deve prevalecer o segundo. A vida é o bem maior do ser humano e a condição para ser tratado com dignidade também", afirmou.

O advogado e professor ressalta ainda que a questão vem sendo debatida na sociedade com um viés muito político, em vez de se levar em consideração os aspectos científicos. Para ele, é fundamental a avaliação de um especialista no assunto para indicar o impacto da exigência do passaporte vacinal no controle da pandemia da covid-19.

"Esta discussão atualíssima, em que se coloca em xeque a supremacia do interesse público em face do particular, a ponderação de princípios constitucionais e a capacidade (ou não) do Estado de intervir em situações extremas, nos leva ao cenário que reside o tão falado 'passaporte de vacinação'. Desta feita, temos que defender medidas que realmente protegem a vida humana, e não medida de natureza política, que priorizam ideologias e propostas políticas eleitoreiras", frisou.

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"Assim, temos que ter uma avaliação técnica de um expert, de um cientista reconhecido no assunto, apontando se realmente o passaporte vacinal hoje é medida relevante para se proteger a vida, ciente de que restrições também podem afetar a vida humana, pois podem trazer miséria, desemprego, violência, criminalidade e negócios fechados", completou.

Projeto pode virar lei a partir do "silêncio" do prefeito

A aprovação do projeto em Lei pode ser definida pela ausência de opinião do prefeito. "No caso, é possível que o prefeito venha a silenciar para não desagradar seus aliados na Câmara", destacou Flavio Fabiano. 

O advogado explica que, após análise do chefe do Executivo, se o prefeito sancionar o projeto, ele se torna lei e é publicado no Diário Oficial da cidade. Mas o prefeito pode vetar uma parte do projeto ou todo ele. Se vetar alguns trechos, a parte sancionada vira Lei, e os vetos voltam para análise da Câmara. 

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"O prefeito tem amplo conhecimento jurídico. Ele não vai sancionar, mas ele pode não querer se manifestar a respeito. Neste caso, o projeto retorna para a Câmara dos Vereadores e o presidente da Casa irá promulgar o projeto e ele se tornará Lei. Então, haverá novo desperdício de dinheiro público pois, como indicado, ocorrerão ações diretas de inconstitucionalidade", criticou. 

"Por fim, destaca-se que nascem mortos esses projetos de Lei dado ao vício de inconstitucionalidade e embora sejam constantemente reproduzidas em todas as mídias e jornais acerca da competência de cada ente federado, ainda assim, fica claro que o Legislativo não está cumprindo seu papel constitucional pois invade a área que não lhe afeta", complementou o especialista.

Vereador diz que projeto defende direito de ir e vir do cidadão

Autor do projeto de lei aprovado nesta segunda-feira pela Câmara de Vitória, o vereador Gilvan da Federal disse à reportagem do jornal online Folha Vitória que o "clamor popular" foi um dos motivos que o levou a apresentar a proposta.

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"Meu celular não para de receber ligações e mensagens de pessoas reclamando da humilhação e do constrangimento que estão sofrendo por causa da exigência do passaporte vacinal. Elas estão sendo coagidas de adentrar um local, como se fossem leprosas", afirmou.

Além disso, o parlamentar alegou que uma portaria não pode afetar o direito constitucional que o cidadão tem de ir e vir.

"O passaporte da vacina começou com uma portaria assinada pelo secretário de Saúde, Nésio Fernandes. Uma portaria, que não é lei. Sem ouvir o povo e sem ouvir a Assembleia Legislativa, que é quem tem a atribuição de fazer as leis no Estado, o secretário fere o direito constitucional das pessoas de ir e vir. É um absurdo uma portaria dividir o povo capixaba, como tem acontecido", ressaltou.

Gilvan da Federal também questiona a efetividade da medida na prevenção contra a covid-19. "Você exigir o uso de máscara e disponibilizar álcool em gel, tudo bem. Mas de onde tiraram a ideia de que o passaporte vai evitar que haja contaminação? Quem tomou a vacina pega e transmite a doença do mesmo jeito", argumentou.

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"Estão oprimindo quem trabalha, gerando emprego e impostos. Muitos comerciantes tiveram um prejuízo enorme com o comércio fechado na pandemia. Agora o Estado quer multar esse comerciante caso os clientes não tenham o passaporte", completou o vereador.

Governo do Estado prefere aguardar manifestação de Pazolini

O governo do Estado irá aguardar o posicionamento do prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos) para se pronunciar a respeito do projeto de Lei que proíbe a apresentação do passaporte vacinal em Vitória para frequentar estabelecimentos públicos e privados como bares e restaurantes. 

O projeto de Lei, de autoria do vereador Gilvan da Federal (Patriota), segue agora para veto ou sanção de Pazolini. A matéria vai contra o que determinou o Governo do Estado, em portaria da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) na última semana de janeiro. 

A portaria recomenda que o comprovante de vacinação deverá ser cobrado em todos os setores onde as pessoas têm que retirar as máscaras para consumir comidas e bebidas, como bares e restaurantes por exemplo. E, essa exigência acontece independente da classificação de risco do município.

A Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) foi procurada para se manifestar. Informou que a manifestação seria feita por meio da Procuradoria Geral do Estado (PGE).

Por meio de nota, a P`GE ressaltou que é necessário aguardar a tramitação do projeto de Lei, que agora vai para sanção ou veto do prefeito. "Mas, vale destacar que a Portaria da Secretaria da Saúde tem fundamento de validade em Lei federal e que o Supremo Tribunal Federal (STF) já afirmou a possibilidade da cobrança do passaporte da vacina", completou.

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Sindicato dos bares e restaurantes também espera definição do prefeito e se preocupa com a "instabilidade das regras"

O Sindicato dos Restaurantes, Bares e Similares do Espírito Santo (Sindbares-ES) disse, por meio de nota, que também prefere esperar pela decisão do prefeito de Vitória para que possa orientar os  de Vitória.

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Ressaltou que tem conversado com todos os atores do segmento, empresários, empregados e clientes. "Mas a entidade questiona a forma como foi adotada a obrigatoriedade do passaporte, principalmente pela evidente dificuldade operacional e aumento de custos para os estabelecimentos", ressaltou. 

A nota prossegue dizendo que "o setor não suporta mais restrições ao seu horário de funcionamento, portanto devemos sempre incentivar a vacinação em massa, para vencermos de uma vez por todas esta pandemia". 

O sindicato, neste trecho, faz referência ao acordo feito com o Estado. O Executivo estadual decidiu abrir mão da restrição de horário de funcionamento dos bares e restaurantes nos municípios classificados em risco moderado para transmissão da covid-19. 

Bares, restaurantes, lanchonetes, lojas de conveniência e distribuidoras de bebidas alcoólicas, por exemplo, só estavam autorizados a funcionar, em cidades nessa situação, de segunda a sábado, até às 22h, e aos domingos até às 16h.

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Mas,  para saírem dessa limitação de atendimento, os estabelecimentos passaram a exigir o comprovante de vacinação dos clientes.

A entidade termina o comunicado se mostrando preocupada com as modificações constantes das regras de combate à pandemia. "De todo modo, nos preocupa a instabilidade das regras a serem seguidas, razão pela qual aguardaremos a publicação da legislação municipal, após a manifestação do Executivo, para assim, orientar nossa base situada no município de Vitória", finalizou.

Prefeitura de Vitória se manifesta

A Prefeitura de Vitória foi procurada para saber se o prefeito irá vetar ou sancionar o projeto. A assessoria do prefeito disse que em respeito à independência e à autonomia dos Poderes, vai aguardar o encerramento do processo legislativo e o recebimento do projeto para analisá-lo.


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