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Polícia

Estelionato do amor: vítimas perdem até R$ 500 mil e autoestima em golpe

Legislação brasileira ainda não tem uma tipificação específica para o crime, mas o aumento de casos acende um alerta

Gabriel Barros

Redação Folha Vitória
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Foto: Reprodução/Pexels
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Mensagens de afeto e carinho e um pouco de atenção. É assim que a maioria dos "estelionatários do amor" começam a se aproximar de suas vítimas. No Espírito Santo, o golpe já fez pessoas perderem cerca de R$ 500 mil, além de deixar marcas profundas na autoestima.

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Uma moradora de Cariacica, de 63 anos, já foi alvo dos criminosos duas vezes. A mulher, que não será identificada, contou ao Folha Vitória que as ações aconteceram há cerca de dois anos. Os suspeitos usaram um site de relacionamento para se aproximar dela.

Para tentar convencer a vítima a passar dinheiro, o criminoso chegou a envolver uma suposta filha, que estaria precisando de dinheiro para pagar a escola.

"Ele dizia que a filha estava em um internado e ele tinha viajado para outro país para comprar ouro. Falou que a filha tinha perdido o cartão que ele tinha deixado com ela e precisava de dinheiro. Ele me pediu dinheiro para ela pagar a escola", contou.

Atenta, a mulher questionou porque o homem não fazia uma transferência. O suspeito justificou dizendo que o dinheiro que ele tinha era para comprar o ouro. Ele ainda tentou apelar dizendo que a menina órfã.

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O suspeito ainda tentou se aproximar da mulher por uma rede social. O homem já tinha adicionado uma conhecida da vítima. Ao conversar com ela, a mulher descobriu que o suspeito também estava iludindo outra pessoa de Domingos Martins. Para ela, ele dizia que precisa de dinheiro porque a filha estava doente.

Outro criminoso entrou em contato com a  moradora de Cariacica tentando aplicar um golpe parecido. Se aproximou, tentou criar um laço com ela e depois começou a pedir dinheiro. O homem dizia que morava em alto mar e que queria mandar um presente para vítima. Segundo a mulher, pedia insistentemente pelo endereço dela. Novamente atenta, ela não caiu no golpe.

Empresária perde R$ 500 mil em golpe

Nem sempre é assim. Segundo o titular da Delegacia de Defraudações (Defa), delegado Douglas Vieira, muitas pessoas acabam caindo no golpe. Casos semelhantes são frequentemente registrados pela Polícia Civil no Estado.

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Em dezembro, a Polícia Civil divulgou informações sobre um homem com mandados de prisão em aberto. Robson Ribeiro teria aplicado golpe em uma empresária da Grande Vitória e deixado um prejuízo de R$ 500 mil para a vítima.

"Os suspeitos agem de duas formas. Em uma delas, eles começam a interagir, criam histórias e inventam histórias. Eles falam que mandaram um presente que ficou preso na alfândega e pedem dinheiro para liberar ou criam outras histórias. Esse é mais difícil de apurar e geralmente acontecem sempre em meio virtual", explicou.

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Na segunda forma, segundo o delegado, os criminosos chegam a conhecer a vítima pessoalmente e, ao perceber a carência, se envolvem e falam que são grandes empresários. 

"Levam a pessoa para hotéis e restaurantes de luxo, geralmente com o dinheiro de outras vítimas, e quando percebem que a pessoa já se encantou, começam a pedir dinheiro", disse. 

Os suspeitos geralmente são de fora do estado. O delegado explica que é um tipo de crime complexo para ser apurado. Não há, por exemplo, dados concretos sobre ele, já que a atual legislação não prevê uma tipificação específica. 

Projeto de lei prevê pena de até seis anos

A advogada criminalista Anna Paulina Cardoso explica que o estelionato amoroso ou sentimental se caracteriza nas situações em que o indivíduo se aproxima da vítima, conquista a confiança e depois exige presentes ou favores financeiros. 

"A fraude se operacionaliza pelo falso interesse amoroso do indivíduo e pela intenção de obter vantagem ilícita da vítima, causando-lhe, além do prejuízo emocional, o financeiro", explicou.

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A advogada destaca que há casos, como o relatado no início da reportagem, em que a vítima sequer se encontra pessoalmente com o indivíduo, mantendo apenas uma relação virtual. 

"A conduta, hoje, encontra-se tipificada no art. 171 (estelionato comum), do Código Penal, que prevê penas de um a cinco anos. No entanto, diante do aumento exponencial de casos semelhantes, a Câmara dos Deputados, em agosto ao ano passado, aprovou a subemenda substitutiva ao projeto de Lei n° 4.229/2015, que tipifica o "estelionato sentimental". A pena, de acordo com o projeto, poderá ser de dois a seis anos de prisão", explicou.

O projeto de lei com pena mais severa ainda depende da aprovação do Senado Federal e ser sancionada. 

"Embora possa parecer tênue a linha entre o que é considerado estelionato e o que são apenas ajudas financeiras consensuais entre um casal, o uso da vulnerabilidade emocional para obtenção de valores e vantagens são elementos que apontam para a prática delitiva", disse.

Como denunciar este tipo de crime?

Apesar de não ter uma tipificação específica, a orientação de quem atua na área da criminalidade é para que as vítimas sempre registrem a ocorrência.

"É muito importante fazer o boletim de ocorrência já que o crime de estelionato depende da manifestação da vítima para ser investigado. A vítima pode fazer a denúncia pela internet ou na delegacia mais próxima. É possível registrar o caso sem o interesse de representação (quando caso é investigado), mas é importante fazer o registro para que a gente consiga mapear os casos. Lembrando, no entanto, que o ideal é a representação", frisou o delegado.

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A advogada orienta que as vítimas reúnam o maior número de documentos possível, como prints de conversas, extratos bancários, comprovantes de transferência e outros que demonstrem as solicitações, o caráter de empréstimo dos valores (se for o caso) e o vínculo afetivo. 

Outro ponto importante destacado pela advogada e pelo delegado é sempre ficar em alerta. 

"As principais medidas de prevenção passam pela observação da evolução do relacionamento, se está sendo muito rápida, o interesse na vida financeira, se há a apresentação de familiares e amigos, se o compromisso é assumido nas redes sociais, além de outros comportamentos que possam chamar atenção", disse Anna Paulina.

Consequências para a saúde mental

A psicóloga da Unimed Sul Capixaba, Flávia Moreira, destaca que este tipo de crime também traz consequências para a autoestima e a saúde mental das vítimas, por envolver abuso psicológico.

"É gerada uma relação, mesmo que inicial, de confiança, de troca, de afeto, então há repercussão emocional efetiva, de rebaixamento de autoestima, aumento de insegurança, aumento do medo, e muitas vezes isso vai tomar uma proporção que pode gerar uma depressão, uma crise de ansiedade, um afastamento dos relacionamentos, da socialização".

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Ela destaca ainda que, principalmente a partir da pandemia, os aplicativos de relacionamento começaram a desenvolver algumas ferramentas para evitar os contatos abusivos.

"Por isso, é importante que quando fizer uso disso, que as pessoas próximas saibam dessa rotina, que elas saibam por exemplo que você vai se encontrar alguém, porque são medidas de proteção e de segurança. Quando conhecemos uma pessoa estranha em um bar, e estamos em torno de amigos, nos sentimentos mais protegidos, as pessoas veem, então quando conhecemos por uma tela, temos que ter medidas de segurança".

A especialista lembrou ainda a importância da rede de apoio. 

"Ter uma rede de apoio, pessoas que você confia, e que possa sempre compartilhar o que sente, o que vivencia, é sempre uma boa estratégia. Mas se está vivendo um momento que tem mais tensão, um nível de sofrimento maior, uma carga mais pesada de angústia, e que necessita de uma melhor organização dos sentimentos, da compreensão do que tá acontecendo, para que possa se recuperar, buscar um psicólogo, um profissional capacitado, é a melhor alternativa", finalizou.
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