Técnico de enfermagem de Vitória 'descobre' que é soldado há quase 20 anos

Imagine você procurar emprego e descobrir que deveria estar servindo o Exército há quase 20 anos! Essa situação inusitada aconteceu com um morador de Vitória. No momento em que foi fazer seu registro profissional, para começar a trabalhar como técnico de enfermagem, Joilson Barreto, de 35 anos, descobriu que deveria estar atuando como soldado no 38º Batalhão de Infantaria (BI), em Vila Velha, desde 1998.

Joilson, que há cerca de três anos trabalha em um trailer no bairro Santa Lúcia, na capital, conseguiu uma vaga no curso de técnico de enfermagem, por meio de um programa de gratuidade, em 2014. Assim que terminou o curso, ele procurou o Conselho de Enfermagem, para dar entrada em seu registro profissional, e um dos documentos exigidos foi o certificado de reservista. 

Segundo ele, foi nesse momento que ele descobriu o problema. "Perguntaram se eu servia o Exército e eu falei que não. Aí falaram 'mas está constando aqui que você serve'. Me mostraram lá no sistema e realmente lá constava como 'distribuido'", disse.

O técnico de enfermagem conta que, quando se apresentou ao serviço militar, foi dispensado. Ele diz que perdeu o certificado original, mas guardou uma cópia. No documento, é possível ler que ele foi dispensado no dia 27 de novembro de 1998.

Segundo Joilson, por cerca de um mês ele foi cinco vezes até a Junta Militar, na tentativa de resolver o impasse, mas somente nesta semana ele conseguiu a segunda via do documento. No entanto, nela constava uma outra data de dispensa: 8 de dezembro. De acordo com o técnico de enfermagem, o tenente que o atendeu não deu muita importância para a diferença das datas.

"Toda hora ele perguntava 'você tem documento que comprova?' e eu falei 'não porque eu perdi e é justamente por isso que eu vim'. E não lembrava que eu tinha uma segunda via no hospital onde eu fiz estágio. Aí ele foi e me entregou o certificado e ainda falou 'taí o documento que você estava precisando para trabalhar. Toma, vai trabalhar. Bom trabalho. Esse caso se encerrou aqui'", contou.

A história foi recebida com espanto por Joilson e também pelo patrão dele, o comerciante Marcos Lucas Dutra, que decidiu buscar orientação para o funcionário. Marcos conta que fez contato com um delegado, mas acha que, nessa história, o buraco é mais embaixo.

"Pelo contato que eu tive com a autoridade policial, a primeira coisa que eles falaram foi 'tem maracutaia nesse negócio. Vai na [Delegacia de] Defraudações e Falsificações (Defa)'. Eu falei 'não, vamos esperar a poeira baixar'", disse o comerciante.

Apesar de já possuir um novo certificado, Joilson preferiu ainda não levá-lo para o Conselho de Enfermagem, pois acha que a discrepância entre as datas pode lhe trazer problemas. Além disso, ele quer entender o que, afinal, aconteceu com o histórico militar dele nos últimos 18 anos.

"Não explicaram porque eu fiquei esse tempo todo lá. Ninguém notou que tinha uma pessoa lotada lá e não sentiram falta desse funcionário até hoje. Só descobriram agora, porque eu fui atrás. Senão eu estava lá até agora", lamentou.

O outro lado

Por meio de nota, o 38º Batalhão de Infantaria informou que Joilson Barreto jamais ingressou às fileiras do Exército Brasileiro. O que aconteceu, segundo a corporação, foi que a data da dispensa de incorporação por excesso de contingente do cidadão não estava atualizada no sistema.

Segundo o Exército, Joilson se alistou na Junta de Serviço Militar no dia 12 de fevereiro de 1998, quando lhe foi concedido o Certificado de Alistamento Militar, determinando sua apresentação na Comissão de Seleção do 38º Batalhão de Infantaria, no dia 21 de agosto de 1998. Iniciada a fase de seleção, foi determinado que o cidadão retornasse ao Batalhão no dia 30 de novembro de 1998, para participar da Seleção Complementar daquele ano.

Ainda de acordo com o Exército, no dia 8 de dezembro de 1998, Joilson foi dispensado e considerado como “Excesso de Contigente”, sendo-lhe concedido o Certificado de Dispensa de Incorporação. Anos depois, houve migração dos dados do cidadão do sistema antigo para o atual, o SERMIL, e a informação de dispensa referente a Joilson Barreto não teria sido cadastrada adequadamente.

O Exército informou ainda que a data da dispensa do cidadão já foi atualizada e ele já recebeu a 2ª Via do Certificado de Dispensa de Incorporação.

Já o Conselho Regional de Enfermagem informou que, para obter o registro de profissional de enfermagem, é preciso apresentar os  documentos pessoais, como carteira de identidade e título de eleitor, além de todos os comprovantes de conclusão escolar. 

Segundo o conselho, dos homens também é exigido o certificado de reservista, entregue pelo Exército quando o jovem é dispensado de servir à patria ou ao final da prestação de serviço, no caso de quem serviu o Exército. 

O Coren informou ainda que também confere os carimbos que devem constar no certificado de reservista. Ao todo, são cinco carimbos.