Medo da Aids faz pacientes lotarem hospital por remédio que bloqueia infecção
Hospital Emílio Ribas em São Paulo recebe até 30 pacientes por dia em busca de medicamento. Segundo Ralcyon Teixeira , supervisor do PS o pronto-socorro realizou 1.400 atendimentos do gênero
No último sábado (15), um rapaz chegou ainda ofegante ao plantão do pronto-socorro do Hospital Emílio Ribas, em São Paulo. Ele tinha participado de um evento em que se expôs ao HIV. Tecnicamente, o jovem fez direitinho a lição de casa: a indicação para o tratamento de profilaxia pós-exposição (PEP) do HIV é de fato mais eficiente quando ministrado até duas horas após o possível contato com o vírus da Aids.
Mas o que era para ser um atendimento eventual, para contatos acidentais, está se transformando em rotina. Muita gente está indo direto da balada para o PS. O tal jovem, como muitos, se expõem intencionalmente contando com a medicação. A prática tem gerado alguns transtornos em centros de referência médica.
No Hospital Emílio Ribas, há dias em que chegam mais de 30 pacientes nestas circunstâncias. E o pronto socorro, onde são atendidos pacientes gravemente enfermos, lota de atendimentos de PEP, entre uma parada cardiorrespiratória e uma convulsão subentrante.
Segundo Ralcyon Teixeira , supervisor do PS do Emílio Ribas, até maio, quando foram levantados os últimos dados, o pronto-socorro realizou 1.400 atendimentos do gênero. A solução imediata, segundo os profissionais de saúde, seria descentralizar efetivamente o atendimento dos pacientes de PEP.
— Essa é uma das nossas brigas. Um atendimento completo desse, leva, em média, umas 3 horas, entre colher o exame (o teste rápido de HIV), receber o resultado e medicar. E esse paciente é passado na frente dos outros, pois o protocolo indica como emergência. A gente tenta cumprir a cartilha, mas a urgência, no caso, é bloquear a infecção. Isso poderia ser feito em outros pronto-atendimentos.
Essa foi a promessa do Ministério da Saúde ao reformular o protocolo para a profilaxia pós-exposição (PEP) do HIV unificada no Sistema Único de Saúde (SUS). A ideia foi integrar os três tipos de PEP existentes: acidente ocupacional, violência sexual e relação sexual consentida. Além disso, o documento também propôs a redução do tempo de acompanhamento do tratamento de seis para três meses.
O protocolo recomenda ainda que os medicamentos utilizados para o tratamento sejam ministrados até 72 horas após a exposição ao vírus. O ideal é que seu uso seja feito nas primeiras duas horas após a exposição ao risco. Ao todo, são 28 dias consecutivos de uso dos quatro medicamentos antirretrovirais previstos no novo protocolo (tenofovir + lamivudina + atazanavir + ritonavir).
“A grande vantagem desse protocolo é a simplificação e unificação da PEP em um esquema único de medicamentos. Com isso, não será preciso um especialista em aids para dispensar a PEP. Isso não só irá ampliar o acesso à população de forma geral, mas também facilitar o procedimentos para os profissionais de saúde como um todo”, explicou o diretor do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais, do Ministério da Saúde, Fábio Mesquita.
O gargalo no Emílio Ribas
Na prática, no entanto, não é o que está acontecendo. A rede nacional de assistência conta atualmente com 517 Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA), 712 Serviços de Assistência Especializada (SAE) e 777 Unidades de Distribuição de Medicamentos (UDM). A PEP sexual continua disponível apenas nos Serviços de Atenção Especializada em HIV/aids (SAE).
Em São Paulo, os CTAs só funcionam de segunda a sexta-feira, em horário comercial. No fim de semana, quando a demanda tem crescido exponencialmente, sobra tudo para o Emílio Ribas. O infectologista Fábio Ribeiro, constata, a cada plantão, a mudança de comportamento de quem procura a PEP.
— A gente tem visto que muitos pacientes estão fazendo o sexo desprotegido deliberadamente e depois vão tomar o remédio. Não é mais uma coisa fortuita. As pessoas estão conscientes do que estão fazendo. Eu recomendo que usem camisinha, mas nós sabemos que esses pacientes não vão usar. Muitos são ‘reincidentes’. O melhor seria oferecer para eles a PREP - profilaxia pré-exposição, que ainda não tem protocolo no Brasil.
Segundo o dr. Fábio, os usuários que querem transar sem camisinha seriam fortes candidatos a usar a PREP e assim tirá-los do pronto-socorro. Atualmente, o medicamento utilizado para a profilaxia pré-exposição tem o nome comercial de Truvada. Mas, como não há antivirais à venda no Brasil fora do sistema único de saúde, existe um mercado negro do medicamento, que chega a custar R$ 2.100, com comprimidos para um mês.
— Chegou a hora de o Ministério da Saúde assumir as suas responsabilidades e instituir a PrEP - Profilaxia Pré Exposição - para a qual o rapaz em questão é forte candidato e muitos que já estão fazendo por aí "no mercado negro".
Pesquisa em andamento
Segundo o Ministério da Saúde, há duas pesquisas em andamento, lideradas pela Fiocruz e pela Escola Paulista de Medicina, que estão testando a eficácia da PREP. E será a partir dos resultados desses estudos é que será definido se o serviço de saúde irá oferecer a Prep no Brasil.
Professor de Medicina da Universidade de São Paulo, o infectologista Esper Georges Kallás é o representante na USP da pesquisa do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz). A droga combina a emtricitapina e tenofovir, cnhecida como GSK1265744, já mostrou resultados positivos em testes conduzidos para tratamento da Aids, e agora terá seu potencial testado como parte da estratégia de prevenção da infecção pelo HIV.
— Os 500 voluntários já foram selecionados e alguns já estão testando a droga há um ano. Os primeiros resultados foram apresentados no Congresso Mundial de Aids, realizado em Vancouver, em julho, e devemos ter uma posição final até dezembro. O que sabemos até agora é que a medicação está sendo muito bem tolerada. Estamos percebendo que os voluntários não tiveram infecção pelo HIV, mas o consolidado só será divulgado no fim do ano.
Estudos como o de Profilaxia Pré-exposição ao HIV (PrEP) já demonstraram que é possível obter 100% de proteção contra a infecção ao longo do tempo, mas para tal é necessária a ingestão diária de um antirretroviral, para o resto da vida. Ou até essas pessoas resolverem retomar a prevenção com o uso de camisinha que ainda é a melhor f
Com informações do Portal R7