De antigo casamento ao dia do crime: os principais trechos do depoimento de Georgeval
Georgeval Alves é acusado de matar e estuprar o filho, Joaquim Alves, e o enteado Kauã Butkovsky. Ele respondeu somente o que foi perguntado pela defesa
O depoimento de Georgeval Alves, acusado de matar e estuprar o filho Joaquim Alves, de 3 anos, e o enteado Kauã Butkovsky, de 6, aconteceu na madrugada desta quarta-feira (19) e fechou o primeiro dia de julgamento, que durou cerca de 16 horas.
>> Quer receber nossas notícias 100% gratuitas? Participe da nossa comunidade no WhatsApp ou entre no nosso canal do Telegram!
O júri popular teve início às 9h de terça-feira (18), no Fórum de Linhares, no Norte do Espírito Santo, e terminou pouco depois de 1h30 da madrugada. Em seu depoimento de quase duas horas, o réu limitou-se a responder somente o que foi perguntado por advogados de defesa.
Além de revelar detalhes sobre o que teria acontecido no dia 21 de abril de 2018, quando as crianças foram mortas, Georgeval confessou que mentiu quando disse, na época do crime, que tentou entrar no quarto para salvar o filho e o enteado.
Ele reafirmou que não cometeu o crime e contou também sobre a mudança de São Paulo para o Espírito Santo e os problemas de saúde que enfrenta, como asma e diabetes, por exemplo. Veja a baixo os trechos do depoimento de Georgeval:
• Mudança de São Paulo para o Espírito Santo •
"Eu sou nascido em São Paulo, vivi a minha vida praticamente toda lá. Depois vim para o Espírito Santo com alguns propósitos, dentre eles, ministerial. Eu fazia parte de uma igreja em São Paulo, onde tive uma conversa com meu pastor da vontade de sair de lá para ter uma vida mais tranquila, porque lá era muito corrido, pois tinha mais de um salão. Ele pediu que eu orasse e que, se fosse da vontade de Deus, eu viria para o Espírito Santo. Depois de uma vida em São Paulo, veio esse desejo de vir para cá. Juliana estava grávida e ela se sentia mais segura aqui. Acho que vim para cá com cerca de 30 anos."
• Primeiro casamento e primeiro emprego como cabeleireiro •
"Fui casado por 10 anos com minha ex-mulher. Trabalhava como cabelereiro aos 12 anos de idade, cortando cabelo na minha garagem, e depois me profissionalizei. Recebi o convite de um amigo, comecei a trabalhar com ele em um salão e fui me profissionalizando. Minha ex-mulher era gerente de uma loja de surf, começamos um relacionamento, namoramos, noivamos, casamos e depois de 7, 8 anos tivemos nosso filho. Não casei com ela no cartório, fizemos uma cerimônia porque tínhamos comprado um apartamento e optamos por não casar em cartório por uma questão de parcelas, para não juntar a minha renda com a dela. Quando eu a conheci, ela tinha uma irmã de 3 anos e quem cuidou dela foi eu. Me separei e ela tinha 13 anos, acompanhei todas as fases. Minha ex-mulher deveria ser ouvida, porque meu histórico com ela não teve nenhum problema com relação a abuso ou qualquer tipo de maus-tratos."
• Problemas de saúde •
Tenho asma desde pequeno e já fui internado algumas vezes. Asma nervosa. Fazia uso de um medicamento, que foi indicado por um cliente que era médico. Desde então, não tive crises recorrentes, só em alguns momentos. Quando fui preso, não pude mais usar o remédio. Faço uso de bombinha, que foi indicada pelos médicos do presídio. Depois, desencadeei diabetes tipo 2, ocasionada por má alimentação. O delegado disse que enquanto eu relatava o que aconteceu com meus filhos, eu me alimentava. Não fiz isso porque eu quis comer, fiz porque eu precisava me alimentar porque minha diabetes estava descontrolada. Um pastor amigo meu levou a comida e eu tinha que me alimentar corretamente. Eu tinha que fazer uma cirurgia de Postectomia, mas não fiz porque a minha diabetes estava descontrolada. O médico que me examinou disse que eu deveria primeiro controlar, para depois fazer a cirurgia. Hoje ela está controlada, graças ao sistema prisional. Não faço mais uso da insulina, só de dois medicamentos."
• Versão de Georgeval sobre depoimento de professora •
"Kauã passou uma semana chorando sem parar e o comportamento foi relatado à Juliana, por isso foi convocada uma reunião. Eu vou falar primeiro em relação ao Kauã, sobre o choro dele recorrente durante uma semana e que só pedia para ficar com a mãe. Eu que, na maioria das vezes, levava ele e Joaquim à escola. Ele ficou choroso sim, mas porque trocou de escola e não queria ir, queria ficar em casa. Minha casa era cheia de gente, de crianças o tempo todo e isso era um ambiente divertido. Por isso, Kauã só queria ficar em casa e Juliana cedia em alguns momentos, mas eu não. Por isso, ele só chamava pela mãe na escola."
• Problemas na escola com Joaquim •
"Em relação ao Joaquim, ele relatou que um menino havia mexido no bumbum e no "pipi" dele. Eu e Juliana conversamos sobre o que fazer em relação à essa situação, porque ele relatou isso em casa. Nós gravamos, porque foi uma orientação do meu pastor para que nada do que disséssemos fosse deturpado. Fomos à escola questionar as professoras, ele era muito pequeno e não sabia se expressar direito. Não sabíamos como isso teria ocorrido, onde teria acontecido. Questionamos a professora sobre o fato disso poder ter ocorrido na escola, ela disse que não. Fomos conversar com a coordenadora da escola e as professores de Joaquim e Kauã, relatei a elas o que aconteceu comigo quando eu morava em um orfanato, na Bahia, e eu não podia imaginar esse tipo de coisas também acontecer com meu filho. Não partiu da escola nos chamar sobre essa situação. Eu e Juliana fomos lá dizer sobre o que teria ocorrido."
• Mentira sobre ter entrado no quarto dos filhos •
"Queria primeiro dizer por quê eu menti. Nesses três dias, antes do meu depoimento, começaram alguns burburinhos de pessoas postando coisas duvidando do fato de eu ter entrado no quarto. Isso começou a repercutir na igreja. Por que eu menti? Foi porque as pessoas começaram a falar que fariam diferente do que eu fiz naquele momento. Os pastores começaram a falar que eu não deveria passar a imagem de covarde e omisso. Eu passei a ficar com medo de ser julgado e menti por esse motivo. Não era bom para mim e nem para a imagem da igreja. O pastor queria que eu desse uma resposta para aquelas pessoas que diziam que eu tinha sido omisso. Eu não queria falar", afirmou Georgeval.
• Reparos na casa •
"Tinha uns 15 dias ou um mês que estávamos morando na casa, não me recordo. Ela era alugada, antiga e tinha sido recentemente pintada, trocado alguns espelhos das tomadas e passado por alguns ajustes. Como estávamos com muita pressa de mudar, o pintor ainda estava trabalhando. O dono já havia dito que precisava fazer uns ajustes nos aparelhos de ar condicionado e eu chamei um eletricista para fazer esses reparos. Quando ligava algumas coisa dentro de casa, o ar condicionado desarmava o disjuntor. Ajudei a trocar a fiação da casa e a recolocar os espelhos das tomadas que haviam sido tirados para a pintura."
• Pedido de dono da casa no dia seguinte •
"Alguns episódios me marcaram sim, principalmente sobre o dono da casa, que foi me procurar no hotel na manhã seguinte. Ele foi lá e começou a chorar, me pedindo para não dizer nada para a polícia e mídia de que a fiação estava velha. Ele achava que eu ia querer pedir alguma indenização e culpar ele pelo que aconteceu. Juliana estava comigo e dois pastores juntos. Eles viram ele chegando no hotel e conversando comigo. Eles presenciaram a chegada dele."
• Relação com o pai de Kauã •
"Era uma convivência harmônica. Até como pastor, eu o aconselhei, principalmente em relação ao Kauã, da relação entre eles. O que eu não consegui entender é: se eu sou esse monstro, porque não perceberam isso antes? Disseram que eu não dava remédio e deixava faltar comida, mas é mentira. Quem supria todas as necessidades deles era eu."
• Selfie, culto e conselhos de pastores •
"O tempo todo eu não estava sozinho. Ouvia o tempo todo as pessoas dizendo que eu não podia cair para não deixar a Juliana cair. Fiz muita coisas aconselhado pelos meus pastores. Não fui eu quem bati a selfie depois do ocorrido. Um casal de pastores que são nossos amigos ligou perguntando como nós estávamos. A preocupação era de que nós não aguentássemos, pois tínhamos perdido nossa filha meses antes. Juliana foi quem teve a ideia de tirar a foto e mostrar que estávamos bem. Ela tirou a selfie e mandou para nossa amiga."
• Negou crime e afirmou: "não sou homicida" •
"Fiquei esse tempo todo sem poder falar, pelas ameaças que venho sofrendo. Me envergonho por ter mentido em relação a dizer que entrei no quarto. Eu deveria ter dito a verdade desde o começo. Eu tenho a perspectiva de futuro que posso provar minha inocência, de não deixar esse legado para os meus filhos de ser um monstro, um homicida, um abusador. Não cometi esse crime. Não incendiei nada, não matei os meus filhos. Não quero deixar essa história da minha vida assim. Eu não sou essa pessoa, não sou um homicida", disse.
• Desabafo sobre mentiras e julgamentos •
"Cinco anos preso, sem poder falar e ouvindo muitas mentiras. Para mim, dói ouvir tantas mentiras. Eu não estuprei meus filhos, nem nunca abusei de ninguém. É a minha vida que está em jogo, a minha vida acabou. Eu não sou essa pessoa. Mesmo recebendo esse tipo de olhar, eu não aguento mais essa situação. Se eu soubesse que seria assim, teria entrado naquele quarto e morrido. Eu não pude falar em momento algum, não pude me expressar nada em momento algum", destacou o réu.
• Horas antes da morte das crianças •
"No dia dos fatos, levei os meninos na escola e fui resolver algumas demandas da igreja. Depois, fui buscá-los e, na volta, paramos em uma sorveteria. Tomamos um sorvete, tirei umas fotos e mandei para Juliana, dizendo que só faltava ela. Recebi a ligação de um irmão da igreja ,que me chamou para ir na casa dele comer uma pizza. Fomos e as crianças ficaram brincando com os filhos dele. Não me recordo que horas voltamos para casa. Era um pouco tarde e eu estava bem cansado", disse ele.
• Sangramento no nariz de Joaquim durante o banho •
"Coloquei o carro na garagem e logo mandei os meninos irem tomar banho. Eles tomavam banho praticamente sozinhos. Joaquim teve um sangramento nasal e, da porta do banheiro, eu falei para ele jogar água. Isso era muito comum, o nariz dele sangrava constantemente. Do nada começava sangrar. Como era algo comum eu não fiquei muito preocupado."
• Início do incêndio •
"Kauã estava no escritório e não queria dormir. Eles queriam dormir comigo no quarto e eu não permiti. Juliana, nesse período, faz uma chamada de vídeo comigo e falou com Kauã. Depois, ele foi para o quarto e pediu para orar por eles. Oramos, fui para o meu quarto, tomei banho e dormi. Não me recordo se despertei por causa do cheiro da fumaça ou se foi pelo barulho na babá eletrônica. Aí sim, já acordado, eu percebi a fumaça."
• Pediu socorro, mas não entrou no quarto •
"Tentei a abrir a porta da sala e não consegui. Estava com muita falta de ar e com dificuldade de gritar. Consegui sair, fui para a garagem e comecei a gritar pedindo socorro, correndo de um lado para o outro. Eu não sabia se outro cômodo da casa estava pegando fogo. Comecei a ter muita falta de ar e vi essas pessoas que pararam em frente a minha casa e perguntaram o que estava acontecendo. Depois, algumas pessoas arrombaram o portão para entrar. Eu realmente estava apavorado e sem saber o que fazer. Estava com muito medo, desesperado para sair daquele lugar. Quando eu sai comecei a gritar no meio da rua só de cueca. Uma vizinha viu e me auxiliou me dando uma bermuda e a camiseta do filho dela. Eu ia entrar na casa e eles me impediram. Pegaram uma mangueira que tinha no quintal para tentar apagar o fogo", contou.
Julgamento continua nesta quarta-feira
O primeiro dia do julgamento de Georgeval Alves durou mais de 16 horas e foi retomado às 10h desta quarta-feira (19). Para este segundo dia, a expectativa é que ocorra a fase de debates entre defesa e acusação e que a sentença de Georgeval seja proferida.
Apesar de ter passado todo o dia em Linhares, o réu foi levado de volta para o presídio de Viana após o encerramento do júri. Ele saiu em uma viatura, escoltado por agentes da Polícia Penal.
Georgeval deve retornar a Linhares nesta quarta-feira. A expectativa é que a decisão dos jurados sobre a culpa ou inocência do réu seja anunciada neste segundo dia.
Com a colaboração de Mayra Bandeira, da TV Vitória/Record TV.
Leia também:
>> "Eu não matei meus filhos, não sou um homicida", diz Georgeval Alves
>> "Georgeval disse que foi orientado por amigo a mentir em depoimento", diz psicóloga forense
>> Psicóloga forense diz que Georgeval Alves não apresenta características dos crimes que é acusado
>> Kauã e Joaquim: julgamento de Georgeval Alves continua