"Defendo que a reivindicação foi legítima, porém foi feita de forma equivocada", diz comandante-geral sobre paralisação da PM
Cel. Nylton Rodrigues
Assumir o comando geral da Polícia Militar do Espírito Santo no meio da maior crise de segurança pública estadual tem sido o maior desafio da carreira profissional do Coronel Nylton Rodrigues.
Há cerca de um mês no cargo, o comandante é um dos responsáveis diretos pela reestruturação da corporação no Estado. Como fazer isso e quais são os desafios que virão pela frente?
Em entrevista ao Folha Vitória, o Cel. Nylton Rodrigues detalha sua função e como será a nova cara da Polícia Militar capixaba. Confira:
Cel. Nylton Rodrigues: Este está sendo o meu maior desafio profissional. A sociedade capixaba passou por um período terrível, um momento triste, mas esse momento foi deixado para trás. Este foi um momento de exceção, de ruptura, onde a polícia deixou de cumprir sua função e deixou a sociedade desamparada. Foi um momento difícil, mas a PM retorna para cumprir sua missão como cumpre há 200 anos.
FV: A crise foi maior – ou demorou mais tempo – do que o governo imaginou?
N.R: Essa crise foi um fato que nós nunca imaginávamos que poderia ocorrer. Não só eu, comandante geral, mas qualquer outro policial achou que isso poderia ocorrer. Foi um erro. É claro que temos direito de reivindicar nossos anseios e nossas conquistas, mas a forma como foi feita não está correta. Eu defendo que a reivindicação foi legítima, porém a forma foi como foi feita foi equivocada, inadmissível. Não podemos optar por cometer um crime, porque aquartelamento é crime, para buscar nossos direitos. Não podemos optar por desassistir uma sociedade para buscar nossos anseios.
F.V: O senhor acredita que a imagem que ficou do governo (para os demais estados do Brasil) após a crise é positiva ou negativa?
N.R: A imagem que fica é de um governo responsável. O governo abriu um canal de negociação com o movimento, com as associações, mas não concedeu o aumento não porque não quer, mas porque não pode. Vivemos a pior crise econômica da história do País, o orçamento dos estados e municípios só reduz, temos inúmeros estados que não tem conseguido fechar a folha de salário, estão devendo. Então, acredito que a imagem que fica é de um governo responsável, que não faz o que não tem condição de fazer, mas deixa um canal de negociação aberto, exatamente para quando puder, dar esse aumento.
F.V: E a imagem da PM perante a sociedade?
N.R: O fato da nossa instituição ter desassistido a população, com a ruptura da realização de um serviço essencial pode ter prejudicado a corporação, arranhado a imagem da polícia junto a sociedade. No entanto, sabemos que a população tem um respeito muito grande pela instituição que está ao seu lado há 200 anos.
F.V: Como reestruturar a corporação e a PM após esse período nebuloso vivido? Quais são suas principais funções agora?
N.R: Internamente, esse momento que nós passamos atingiu em cheio os nossos principais valores, como hierarquia e respeito. A reestruturação da PM passa pelo resgate desses valores, que serão resgatados pela força do exemplo das suas lideranças. Esse exemplo do alto comando vai chegar até o soldado e isso vai resgatar esses valores que foram “feridos”. Com relação a operacionalidade, o nosso maior desafio é aumentar a visibilidade e ostensividade da polícia nas ruas. Vamos fixar os policiais nas áreas importantes, com maior vulnerabilidade social e vamos aproximar o policial do cidadão ao qual ele tem a obrigação de proteger. Essa, inclusive, será uma das missões dessas novas Companhias Independentes que estão sendo criadas.
F.V: O que pode acontecer com esses quase três mil policiais que foram processados pela PM?
N.R: Esses policiais serão julgados e, se forem acusados nos inquéritos, serão encaminhados ao Ministério Público Militar. O que eu posso dizer é que todos terão direito a sua ampla defesa e que cada conduta será individualizada. Cada um vai responder pelo que fez e não pelo que o “todo” fez.
F.V: Ainda dentro desse processo, haverá novo concurso para a formação de novos oficiais num futuro próximo?
N.R: Por enquanto, não. Não tem como prever o que vai acontecer com esses policiais que serão julgados. Mas, se no futuro, for preciso, iremos fazer novos concursos.
N.R: O modelo antigo colocava a antiguidade como grande critério para promoção dos oficiais. Nesse novo modelo, juntamos o critério da antiguidade com o critério da meritocracia, do merecimento. Ele agrada os bons policias, que prestam um bom serviço. Já aqueles que não prestam um bom serviço vão ter dificuldade na sua promoção. É uma lei que todos os estados do país já atualizaram e o nosso não havia atualizado ainda. Posso dizer que essa lei vai ser boa para a sociedade e para os bons policiais, para os que prestam um bom serviço.
F.V: Depois desse período conturbado, qual vai ser o papel da PM no futuro?
N.R: A polícia vai continuar cumprindo a sua missão, como faz há 200 anos: trabalhar para a sociedade capixaba.