Por que Daniel Alves está preso e Robinho, não? Entenda diferenças entre os casos
Ambos foram acusados de crime sexual, mas apenas o lateral-direito chegou a ser preso, ainda que de forma preventiva
Daniel Alves está preso de forma preventiva, sem direito à fiança, desde a última sexta-feira, dia 20 de janeiro, por um suposto estupro contra uma mulher de 23 anos em uma casa noturna de Barcelona, na Espanha.
O lateral-direito, presente no elenco da seleção brasileira na Copa do Mundo do Catar, foi detido após prestar depoimento e nega todas as acusações.
No último ano, outro caso de crime sexual repercutiu no cenário brasileiro. Robinho, ex-jogador do Santos, Real Madrid, Manchester City, Milan e seleção brasileira, foi condenado pela Justiça italiana, em última instância, por estupro coletivo cometido em 2013 contra uma mulher albanesa, à época com 22 anos, em uma casa noturna em Milão. Ele recebeu pena de nove anos, mas ainda não cumpre sua pena.
Ambos foram acusados de crime sexual, mas apenas Daniel Alves chegou a ser preso, ainda que de forma preventiva. Em resumo, Robinho segue em liberdade porque se mudou para o Brasil antes de ser condenado pela Justiça da Itália. Desta forma, se beneficia da lei brasileira, que não permite que brasileiros sejam extraditados.
"Sobre o ponto de vista material, os casos de Robinho e de Daniel Alves são bastante parecidos, uma vez que, em relação aos dois, pesam acusações de estupro ou qualquer forma de importunação sexual sem o consenso da vítima", explica Acacio Miranda da Silva Filho, especialista em Direito Constitucional e Penal, mestre em Direito Penal Internacional pela Universidade de Granada, na Espanha.
Daniel Alves foi detido após prestar depoimento na Espanha, estando submetido às leis do país. Além disso, o lateral-direito tem dupla nacionalidade - espanhola e brasileira.
Caso viajasse ao Brasil, não haveria forma de extraditá-lo para a Espanha, semelhante à situação de Robinho. Caso venha a ser condenado, o lateral pode cumprir sua pena no país, sem a necessidade de ser extraditado.
De acordo com a legislação espanhola, um acusado pode ser preso antes de seu julgamento em três situações: risco de fuga, do País ou de algum território no qual o acusado possa ser julgado; alteração de provas; e proteção da vítima.
Na decisão da juíza Maria Concepción Canton Martín, que decretou a prisão preventiva do jogador na sexta, foi apontado risco de uma fuga, uma vez que o atleta não mora mais na Espanha e possui recursos financeiros para deixar o país a qualquer momento. Além disso, a Espanha não tem acordo de extradição com o Brasil.
NOVO CÓDIGO PENAL ESPANHOL E PRISÃO PREVENTIVA
Em outubro de 2022, o Código Penal da Espanha foi alterado com o acréscimo de uma nova lei, a qual prevê que os crimes sexuais devem ser tipificados de acordo com o consentimento da vítima.
Chamada de "Só sim é sim", ela passou a considerar que todos os atos sexuais não consensuais passam a ser considerados violência.
Matheus Falivene, doutor e mestre em Direito Penal pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), explica que a nova lei implica que o ônus da prova, com relação ao consentimento, seja do acusado.
"Esta lei acaba invertendo uma lógica do processo penal no qual o ônus da prova seria de quem acusa. Nos casos destes crime contra a dignidade sexual, o homem teria que provar de forma inequívoca que houve o consentimento", afirma.
O Código Penal da Espanha considera como agressão sexual "atos de caráter sexual que sejam realizados com recurso à violência, intimidação ou abuso de uma situação de superioridade ou vulnerabilidade da vítima".
No caso de Daniel Alves, ele pode ser condenado de um a 15 anos de prisão e a Justiça brasileira não pode interferir, já que a Espanha é soberana no caso.
Além da possibilidade de fuga, a prisão preventiva de Daniel Alves foi decretada por causa das contradições em seu depoimento na Justiça espanhola.
De acordo com informações do jornal espanhol El Periódico, essa situação deu mais força às alegações da denunciante, associadas principalmente aos exames e provas colhidas no local, entre elas sêmen encontrado no banheiro vip da casa noturna. Daniel Alves teria trancado, agredido e estuprado a mulher no local.
Uma destas contradições em seu discurso foi a presença de uma tatuagem. De acordo com o jornal El Mundo, a vítima descreveu que o jogador teria uma meia-lua tatuada entre o abdome e as partes íntimas, que só poderia ser vista caso estivesse sem roupa.
Na Espanha, a prisão preventiva pode durar até quatro anos, até que o caso seja julgado por completo. No momento, o processo está na parte da colheita de provas e não há data prevista para um resultado em definitivo.
CASO ROBINHO
No caso de Robinho, a Justiça italiana pediu a extradição do jogador e de seu amigo Ricardo Falco - ambos condenados por estupro -, em outubro de 2022, quase nove meses após a confirmação da sentença do jogador pela Suprema Corte do país.
O pedido foi negado pelo Brasil, mas Flávio Dino (PSB), atual ministro da Justiça, afirmou na semana passada que Robinho poderia cumprir pena em seu País.
"O exame definitivo compete a questões jurídicas, não são questões políticas. A própria Constituição brasileira proíbe a extradição de cidadãos brasileiros natos. Mas, agora pode, em tese, haver esse cumprimento de pena, mas isso precisa ser examinado e isso efetivamente tramitar", disse Dino. Segundo o ministro, o caso ainda não chegou às suas mãos.
Para que Robinho cumpra sua pena de nove anos no Brasil, essa decisão deve ser homologada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
"Essa relação, entre o Brasil e Itália, passaria por uma intermediação do Itamaraty", explica José Beraldo, advogado criminalista. "Mesmo assim, o caso seguiria o mesmo regime de progressão de pena da Itália, começando pelo regime fechado."
Robinho já está, desde o último ano, na lista vermelha da Organização Internacional de Polícia Criminal (Interpol), no qual ele perdeu sua proteção jurídica, conferida pela Constituição Brasileira, caso deixe o País.
O jogador e seu amigo foram condenados com base no artigo "609 bis" do código penal italiano, que fala do ato de violência sexual não consensual forçado por duas ou mais pessoas, obrigando alguém a manter relações sexuais por sua condição de inferioridade "física ou psíquica".