Cineasta visita o Espírito Santo e concede entrevista exclusiva ao Folha Vitória. Confira!
Luiz Carlos Barreto, É um dos homens-chave da cultura e do cinema nacional, e veio ao Espírito Santo a fim de revisar um livro de memórias, que, aos 88 anos muito bem vividos, não são poucas.
O cineasta Luiz Carlos Barreto, um dos homens-chave da cultura e do cinema nacional, veio ao Espírito Santo a fim de revisar um livro de memórias, que, aos 88 anos muito bem vividos, não são poucas. Achou uma beleza o fato de que seu celular não pegava em Pedra Azul. "Sabe que nos Estados Unidos já tem clínicas para dependentes de tecnologia?", comenta.
Aqui encontrou um refúgio... até a página 12, ou melhor, até o primeiro pedido de entrevista. Foi chegando e perguntando: "vai ser gravado? Então melhor ficar ali, por causa da acústica", apontou, indicando a pérgula do jardim da única pousada com o selo Exclusive Collection Hotels no Estado. Afinal, ele é o cara que derrotou “Tubarão” e “O Exorcista” na bilheteria dos cinemas brasileiros com “Dona Flor e seus Dois Maridos”, com mais de 80 filmes no currículo.
Mas quando não está dirigindo ou produzindo a cena, o jovem senhor que começou a vida como repórter-fotográfico está clicando a amada, Lucy, com ele há 65 anos e cujo casamento é a prova de que "uma moça mineira de fino trato pode conviver harmoniosamente com um cearense retirante", conforme brinca. E põe harmonia nisso.
O carinho com o qual eles se tratam chamou a atenção dos funcionários do hotel. "Ela é a mulher mais fotografada do Brasil. Devo ter mais de um milhão de fotografias", gabava-se, enquanto ela fazia biquinho para a câmera. O jornal online Folha Vitória aproveitou a visita ilustre ao Estado para conversar com o casal. Confira!
Falaram que o Senhor está fazendo esse retiro de dez dias nas montanhas capixabas para escrever um livro. É verdade?
Barreto: 'Não...(Risos). A Editora Leya me pediu pra fazer um livro sobre minha trajetória. Fiz um depoimento de vários dias para um jornalista e agora estou fazendo uma revisão. Mas não é uma biografia."
Vocês assistiram ao Oscar ontem? Gostam de acompanhar?
Lucy: "Eu assisti , ele dormiu. Estão chamando a gafe de vexame mas Warren Beatty e Faye Dunaway já tem certa idade. Nosso Bonnie & Clyde tropeçaram (risos). Mas isso até dá um pouco de graça à cerimonia, que, em geral, é circunspecta."
Barreto: "Sim, até dá um charme, pois é tudo tão corretinho... É preciso ter um errinho."
Gostaram de "La La Land", eleito melhor filme?
Lucy: "
Barreto: "Começa como musical moderno e fica como os antigos. Para os tempos atuais, a história é água com açúcar..."
Como é a festa do Oscar de perto?
Lucy: "Nós participamos do Oscar com o filme do Fabio
Barreto: "Se sai um ator para beber champanhe no intervalo, outro senta para não dar buraco. É um grande programa de auditório visto no mundo todo, audiência como da Olimpíada e Copa do Mundo."
O senhor uma vez falou que o cinema virou vídeo game, faltam bons roteiros?
Barreto: "Hollywood já fez uma prospectiva do que vai acontecer no mercado. Vão sobreviver os filmes autorais,
Fale do filme do João Carlos Martins?
Barreto: Esse projeto é da Lucy e da Paula (Barreto). Na produtora temos projetos meus, da Lucy, da Paula e do Bruno. Já está em finalização e sonorização. Devemos ter uma cópia em abril. Mas será lançado em 3 de agosto.
Vemos cada vez mais pessoas vivendo de cinema. É mais fácil começar hoje ou na sua época?
Lucy: "
Barreto: "Às vezes olho a lista de filmes do Now e vejo muitos filmes que nem sabemos que existem. Com o negócio de produzir pra TV, surgiram muito produtor independente e muito realizador jovem. Talvez o Brasil seja o país que mais tenha “primeiros filmes” por ano do mundo. Existe um sistema de financiamento que tanto faz um garoto que vai começar ou um que já tem dez filmes no currículo. Seria mais produtivo se houvesse distinção entre os que estão começando e os que estão dando continuidade à sua obra. O lado positivo é que toda hora surge um novo diretor. Kleber Mendonça, por exemplo, que surgiu de repente com dois filmes maravilhosos."
Então é mais fácil começar hoje...
Lucy: "É verdade. O Ministério da Cultura criou o chamado B.O., que são os filmes de baixo orçamento. Se os atores se interessam pela história, entram como coprodutores. De certa forma é mais fácil sim, tem muitos jovens começando."
E o Canal Brasil?
Barreto: "É um canal que é um consórcio de cinco produtores, entre os quais nós, que o fundamos. A Globo se associou e passamos a ser um dos canais distribuídos por ela. Mas toda produção artística e administrativa é do nosso Grupo. Temos total controle da programação."
Como é sua rotina, o que te toma mais tempo?
Barreto: "Não só o meu mas de todo produtor no Brasil: livrar-se da burocracia da Ancine, que é pior do que a burocracia do Estado Brasileiro. Eles criaram uma burocracia acima da burocracia do Estado."
Como resolver isso?
Lucy:
Barreto: "Nós temos uma grande amiga que já morreu, Violeta Arraes, irmã do Miguel Arraes, que dizia: burocracia é como colesterol: tem a boa e tem a ruim”(risos)."
Será que o Brasil não enxerga o potencial da indústria do cinema, que é uma indústria limpa?
Lucy:
Barreto: "Nos Estados Unidos, o cinema é tratado como política de Estado e não de governo. Tanto, que a sede da Motion Pictures Association, associação das sete maiores produtoras americanas, tem escritório dentro da Casa Branca. Isso desde a época do Roosevelt. Eles sabem que o cinema é uma questão muito importante para a formação da mentalidade nacional e para projetar a imagem do país fora. Armaram não só um sistema de produção como um sistema de comercialização e distribuição que ninguém tem igual."
É verdade que o senhor flagrou a Marilyn Monroe com os Kennedy quando era fotógrafo?
Barreto: "
A Lucy já existia na sua vida quando fotografou a Marilyn?
Lucy: "Claro! Estamos casados há 63 anos!"
Quero saber o segredo do casamento feliz pois todos os funcionários estão encantados como se tratam com tanto carinho...
Barreto: "É um recorde! (risos)."
Lucy: "
Barreto: "O segredo não é um segredo. Lucy é mineira de classe média alta, educada em colégio para moças de fino trato. Eu sou cearense popular de uma família de onze filhos. Intelectualmente temos afinidades, mas socialmente tínhamos tudo para não dar certo. Então somos um exemplo de convivência democrática, a prova de que é possível a classe dominante conviver com a classe excluída (risos). Mas também temos nossos arranca-rabos. Mas aí é que está o segredo. Se você parar de brigar é sinal que o negócio esfriou!"
Como vocês se conheceram?
Lucy: "Correr pro abraço?"
Barreto: "É uma gíria de futebol. Faz o gol e corre pro abraço!"
Lucy: "Ah, bom! Nisso somos muito diferentes. Ele gosta muito de futebol, já foi jogador. Meu negócio é música, estudei em Paris. Tem essa diferença entre nós mas a gente consegue administrar. Quando ele vai assistir um jogo, aos domingos, tenho amigos com quem vou assistir óperas e músicas orquestrais."
E os projetos?
Barreto: "
E o documentário do porto do Rio?
Barreto:
Ok, vocês contaram o segredo do casamento feliz. E o segredo da vitalidade depois dos 80, sem parar de trabalhar?
Lucy: "Além de trabalhar, fazemos exercícios físicos todos os dias: 40 minutos de bicicleta, 200 abdominais e por aí vai. Se não faço meu aeróbico todo dia eu fico insuportável (risos). Sou muito exigente. Termino meus exercícios e estou ótima, cheia de endorfina. "
Barreto: "Parou, morreu!"
(Entrevista realizada pela colunista social do Folha Vitória Andrea Pena)