Embargo chinês derruba cotação no campo, mas carne continua cara no prato
Com a exportação para a China parada, os frigoríficos cortaram os abates e as compras de boi gordo.
A suspensão das exportações de carne bovina para a China, que já dura mais de um mês e meio, abalou a cadeia de produção da pecuária. Com a queda na procura por boi gordo pelos frigoríficos, a cotação da arroba teve forte retração no campo. Porém, os preços da carne continuaram praticamente firmes tanto no atacado, quanto no varejo, sem trazer alívio para o bolso do consumidor.
No interior paulista, por exemplo, a cotação média da arroba caiu 13% entre agosto, antes do embargo, e meados de outubro, segundo o diretor da consultoria Athenagro, Maurício Palma Nogueira. No mesmo período, o preço da carne desossada no atacado paulista recuou muito menos, quase 1%, observa o consultor.
Já no varejo da cidade de São Paulo, as carnes bovinas ficaram 0,62% mais caras nas últimas quatro semanas até 18 de outubro, conforme aponta o Índice de Preços ao Consumidor da Fipe.
O descompasso do movimento dos preços entre campo, atacado e varejo ocorre porque os elos da cadeia reagem de forma diferente. Com a exportação para a China parada, os frigoríficos cortaram os abates e as compras de boi gordo.
"Os frigoríficos trabalham hoje com uma ociosidade de 50%", afirma a analista da consultoria Scot, Jéssica Olivier. Essa freada nas compras derrubou o preço do boi gordo, segundo a analista, não só em São Paulo, mas também em diversas praças do Brasil.
Como nem todas as partes do boi são exportadas, lembra Nogueira, com a diminuição dos abates em geral, o efeito imediato é uma menor oferta de carnes que geralmente ficam no mercado interno, como os cortes traseiros (carne de primeira), já que o dianteiro (carne de segunda) normalmente é voltado para exportação. Essa menor disponibilidade acaba sustentando os preços ao consumidor.
Além da redução na escala de abates, Jéssica acrescenta outro fator que tem contribuído para manter as cotações da carne no atacado e no varejo, não refletindo, assim, o que ocorre no campo.
"Como a arroba ficou por muito tempo com preço elevado, a margem do frigorífico diminuiu", explica. Agora, com esse alívio no preço do boi, os frigoríficos estão usando essa oportunidade para recuperar o que perderam.
Exportações
Do ponto de vista das exportações, a falta de sinalização do país asiático de até quando vai o embargo ao produto brasileiro também causa estragos. As vendas foram suspensas depois do registro de dois casos atípicos do mal da vaca louca, em Minas e em Mato Grosso.
Com o impasse, o Brasil já deixou de vender para a China cerca de 100 mil toneladas de carne bovina este mês. Esse volume renderia um pouco mais de cerca de US$ 600 milhões em divisas, nas contas de Jéssica. Para chegar a esse número, ela considerou a média dos embarques dos últimos três meses.
Na avaliação do presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, o prejuízo, por enquanto, é pequeno. "Se nada acontecer até o final do ano, o País vai deixar de exportar US$ 1,5 bilhão em três meses", calcula.
O quadro mais pessimista, segundo ele, seria o embargo não ser resolvido nos próximos 12 meses. Neste caso, a perda de venda externa alcançaria US$ 6 bilhões. "Aí sim, seria muito impactante", afirma.
É claro que, neste caso, a saída seria buscar novos mercados, pondera. Mas a China ainda é o grande mercado e responde por cerca de metade das exportações brasileiras de carne bovina.
O que intriga Castro neste momento é a falta de interesse da China de resolver a questão. "No passado, um episódio semelhante foi equacionado em 13 dias", lembra. Pelo tempo decorrido desde o início da suspensão, em 4 de setembro, ele desconfia que possa haver algum componente político de represália da China ao Brasil. "Já está passando dos limites técnicos."
Procurada, a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes não quis se manifestar sobre o tema. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.