/1034847/FOLHA_VITORIA_AMP_TOPO |
Economia

PEC do teto enfrenta novo teste

Há quase duas décadas especialistas alertam, em vão, que a Previdência é uma bomba-relógio. Seu gasto vem crescendo 4% acima da inflação e comprometendo um volume sempre maior do Orçamento

Estadão Conteudo

Redação Folha Vitória
audima
audima
O texto já foi aprovado em primeira votação na Câmara Foto: Divulgação
pp_amp_intext | /1034847/FOLHA_VITORIA_AMP_02

São Paulo - Apesar de tratar de uma legislação recheada de sutilezas jurídicas e muito economês, a discussão sobre a Proposta de Emenda Constitucional sobre o limite de gastos para governo federal, a chamada PEC do Teto de Gastos, tem de tudo, menos tédio. Nas redes sociais, a proposta é demonizada. Nos embates no Congresso, virou instrumento de polarização do ainda tenso cenário de divergências partidárias. Para muitos especialistas, deve ser aprovada como está, mas alguns põem em dúvida sua utilidade.

O jornal O Estado de S. Paulo ouviu economistas que passaram as últimas semanas destrinchando a mecânica da PEC e contrapôs as dúvidas aos argumentos do governo, que joga todas as suas fichas na aprovação do projeto.

O texto já foi aprovado em primeira votação na Câmara, com uma larga vantagem: 366 votos a favor e 111 contra. Volta ao plenário para votação em segundo turno na terça-feira. Inicialmente, seria na segunda, mas o governo teve medo de que não houvesse quórum. Há um acordo prévio presumindo a que a PEC será votada em primeiro turno no Senado em 29 de novembro e, em segundo turno, em 13 de dezembro.

pp_amp_intext | /1034847/FOLHA_VITORIA_AMP_03

Fora do Congresso, o debate sobre as mudanças é intenso. Apesar de a dinâmica ser simples - limitar o gasto de um ano pela inflação do ano anterior -, muitas são as perguntas e dúvidas em relação ao seu impacto e eficiência. Nem entre os seus defensores a PEC é tema consensual.

Como a regra vai vigorar por 10 a 20 anos, há quem peça cautela e serenidade na discussão para que se possa aperfeiçoar o texto. Mas existem os que defendem a rápida aprovação do já posto em trâmite. "O texto é perfeito como está: é uma maneira engenhosa de obrigar o País a fazer as reformas que precisa", diz Samuel Pessôa, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas - Ibre/FGV.

Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos, segue na mesma linha. Argumenta que, em vez de perder tempo com a discussão de "sutilezas", o importante é aprovar a PEC e partir para o próximo capítulo do ajuste fiscal. "Precisamos seguir logo a reforma da Previdência, cuja conta é explosiva."

pp_amp_intext | /1034847/FOLHA_VITORIA_AMP_04

Há quase duas décadas especialistas alertam, em vão, que a Previdência é uma bomba-relógio. Seu gasto vem crescendo 4% acima da inflação e comprometendo um volume sempre maior do Orçamento. Com o teto, se esse avanço não for controlado, vai consumir os recursos de outras áreas.

Segundo avaliação feita pela Consultoria de Orçamento e Fiscalização da Câmara, sem a reforma, nos próximos 10 anos, o gasto com a Previdência vai praticamente dobrar - serão mais de R$ 360 bilhões acima do teto. "Se não fizerem a reforma da Previdência, apenas saúde e educação serão preservados. Os demais setores vão ter uma redução brutal de recursos e vai ser uma briga ferrenha pela pequena quantidade de receita orçamentária que vai sobrar", diz Leonardo Rolim, consultor de orçamento da Câmara e ex-secretário de Previdência.

De acordo com José Luis Oreiro, professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, a população brasileira cresce a uma taxa de 0,8% ao ano. "Fazendo uma conta bem grosseira, significa que, em 10 anos, seriam 20 milhões a mais de brasileiros. Por mais que se corrijam as ineficiências na gestão da saúde e da educação, não é plausível acreditar que, fazendo um congelamento dos gastos dessas áreas, em termos reais, será possível acompanhar o aumento da demanda, principalmente em relação à Saúde", disse. "Os gastos per capita vão cair. Eu defendo a seguinte regra: ajustar os gastos primários dessas áreas pela inflação do ano anterior mais o crescimento da população - para, pelo menos, manter os gastos em termos per capita, ou seja, por habitante, constantes ao longo do tempo."

pp_amp_intext | /1034847/FOLHA_VITORIA_AMP_05

Na avaliação de Vilma Pinto, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas, é importante frisar que o investimento público é uma variável importante para promover o crescimento. "Mas é a primeira rubrica que se corta quando você precisa conseguir recursos adicionais. O investimento já vem sofrendo cortes desde 2014. Está num nível muito baixo e vai entrar no teto previsto na PEC já menor do que era. Vamos lembrar que a PEC não será alterada nos 10 primeiros anos", comentou. "Então, serão dez anos sem a possibilidade de fazer uma política de ampliação de investimentos, ainda que ocorra uma recuperação da economia mais rápida e se gere folga na receita adicional para isso. A minha preocupação é essa: afinal, como está, parece que a PEC do Teto prejudica o investimento."

O especialista em contas públicas e assessor econômico no Senado Federal Felipe Salto destacou que a PEC determina que se aplique a inflação do ano anterior para reajustar os gastos do ano seguinte. "Ao meu ver, há uma desbalanceamento aí. Isso gera um esforço muito pequeno no curto prazo. A inflação do ano que vem tende a rodar em torno de 4,5%, mas vai se usar como indexador a inflação deste ano, 7,2%. Você está autorizando aumento real, acima da inflação. Lá na frente, porém, a aplicação dessa regra, sem nenhuma mudança, vai gerar enormes superávits (economia de recursos), perto de 6% do PIB (Produto Interno Bruto)", avaliou. "Não seria melhor que, a partir de uma determinada taxa de crescimento, o indexador fosse alterado: a meta de inflação, mais o crescimento do PIB, por exemplo?"

pp_amp_intext | /1034847/FOLHA_VITORIA_AMP_06

Monica de Bolle, pesquisadora do Peterson Institute for International Economics em Washington, diz entender que, neste momento, o foco seja corrigir o "enorme desajuste do resultado primário (a grosso modo, como o governo gasta o que arrecada)". "Mas não entendo por que uma PEC que traz mudanças para 20 anos - espaço de tempo em que a inflação e os juros, se pretende, vão cair - não prevê em nenhum momento que esse instrumento evolua para conter a despesa nominal como um todo (o resultado nominal aborda o primário e também o resultado financeiro do governo, o que inclui despesas com os juros da dívida). Precisa ser assim se a gente almeja ser prudente. A maioria dos países que tem regras fiscais usa despesa nominal como referência. A zona do euro, por exemplo, tem teto de despesa nominal."

Para Fernando Veloso, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas, o desenho geral da PEC é "muito bem elaborado". "Houve alguma discussão em torno da redução do prazo de 20 anos. Mas o prazo precisa mesmo ser longo porque a PEC visa a estabilizar a dívida e entende-se que isso vai demorar para acontecer. A dívida atualmente está em 70% do PIB (Produto Interno Bruto). A previsão é que, com a PEC, estabilize na próxima década em 90% e comece a cair. Sem PEC, vai passar de 100%", salientou. "Na média, entre os países emergentes, a dívida está em 40%. Houve uma proposta para que, se ela caísse a 50%, a PEC deixaria de valer. Se a economia crescer antes e mais do que esperado, os juros caírem e a dívida ceder indo a 50%, seria razoável prever a possibilidade de revisão da PEC." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

/1034847/FOLHA_VITORIA_AMP_FINAL_DA_MATERIA |
/1034847/FOLHA_VITORIA_AMP_FINAL_DA_MATERIA |

Nós utilizamos cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar a sua experiência em nossos serviços, personalizar publicidade e recomendar conteúdo de seu interesse. Ao utilizar nossos serviços, você concorda com tal monitoramento. Saiba mais sobre nossa Política de Privacidade.