Saúde mental: a nova fronteira da legislação trabalhista?
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), é do Brasil o primeiro lugar no mundo quando se trata de ansiedade e quinto em número de depressivos
Os casos de transtornos mentais têm se multiplicado mundo afora e, no Brasil, as estatísticas não são diferentes, o que desafia autoridades sanitárias, gestores de Recursos Humanos e juristas.
Isso porque será necessário criar mecanismos para lidar com o crescimento entre 12% e 15% em atendimentos de saúde no Brasil nos últimos quatro anos, segundo a consultoria Alvarez&Marsal.
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O Brasil ocupa a terceira posição no índice de saúde mental mundial, segundo o relatório “Estado Mental do Mundo 2022”.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), é do Brasil o primeiro lugar no mundo quando se trata de ansiedade e quinto em número de depressivos.
Além de abreviar a expectativa de vida entre 10 e 20 anos e afetar o bem-estar dos trabalhadores e suas famílias, os transtornos mentais são, atualmente, a maior causa de incapacidade.
Em 2023, o INSS concedeu 288.865 benefícios por incapacidade em função de transtornos mentais, 38% a mais do que em 2022.
No ambiente laboral, o comprometimento da produtividade resultante deste quadro custa à economia global cerca de US$ 1 trilhão por ano, montante que deve chegar a US$ 6 trilhões em 2030, segundo a revista The Lancet.
No Brasil, estima-se que 5% do PIB será comprometido com custos de saúde, absenteísmo, afastamentos e aposentadorias precoces em consequência de transtornos mentais.
Diante deste cenário, o governo brasileiro se movimenta para estimular as empresas a reconhecerem a gravidade do quadro e atuarem para mitigar seus efeitos.
Em 2023, a Lei 14.556 oficializou o Janeiro Branco, instituindo campanhas de conscientização sobre saúde mental.
Já a Lei 14.831/2024, publicada em março, institui o Certificado Empresa Promotora de Saúde Mental, concedido àquelas que, após avaliadas por uma comissão certificadora, receberem o reconhecimento pela promoção do bem-estar dos trabalhadores.
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Para obter tal certificação, a empresa deve desenvolver políticas e ações que visem ao bem-estar dos trabalhadores e à promoção da saúde mental.
Isso inclui, por exemplo, por exemplo, oferecer acesso a recursos de apoio psicológico e psiquiátrico para seus trabalhadores, promover um ambiente de trabalho seguro e saudável e incentivar o equilíbrio entre a vida pessoal e a profissional.
Ainda carente de regulamentação, a Lei é vista pelos seus autores como um passo para reconhecer o quão relevante é o problema. Entretanto, sua utilidade e necessidade precisam ser avaliadas.
A legislação já prevê, há muitos anos, mecanismos que podem coibir práticas que levem a doenças de ordem psicológica no ambiente de trabalho.
Para citar apenas alguns exemplos, há na Constituição da República o direito à limitação da jornada de trabalho e ao repouso semanal remunerado, já na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), existe a previsão do direito a um ambiente de trabalho saudável e seguro, a proteção à autoestima, à saúde e ao lazer, além da possibilidade de indenização aos trabalhadores que tiverem esses direitos violados.
Mesmo com um robusto arcabouço legal, de acordo com o Tribunal Superior do Trabalho, entre 2020 e 2023, a Justiça do Trabalho julgou mais de 400 mil casos de assédio moral e sexual, que estão entre as principais causas de doenças de ordem psicológica relacionadas ao trabalho.
Da mesma forma, se multiplicam ações que têm como objeto o trabalho em excesso, já sendo reconhecida, inclusive, a possibilidade de causar dano existencial aos trabalhadores.
O mesmo se pode dizer sobre ações fundamentadas no não cumprimento de regras básicas de saúde e segurança do trabalho.
Em resumo, a multiplicação de leis e novas obrigações para as empresas nem sempre é eficaz para a solução de um problema no âmbito laboral; é necessário que essas normas sejam aplicadas pelas empresas.
Urge agir de forma consistente para lidar com o desafio do crescimento dos transtornos mentais, especialmente os relacionados ao trabalho, para evitar que as empresas estejam fadadas a, apesar de todos os avanços tecnológicos, serem derrotadas pela incapacidade de gerar bem-estar aos trabalhadores.
*Artigo escritpo por Roberta Valiatti Ferreira, advogada, sócia de Lima & Valiatti Advogados e Membro do Comitê Qualificado de Conteúdo de GRC do IBEF-ES; e Cintia Dias, jornalista, publicitária e membro do Comitê Qualificado de Conteúdo de ESG do IBEF-ES.pp_amp_intext | /1034847/FOLHA_VITORIA_AMP_06
*Este texto expressa a opinião do autor e não traduz, necessariamente, a opinião do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças do Espírito Santo